Um pouco tarde – mas antes tarde que nunca – vou postar a minha análise da polêmica mão de John Hesp, o simpático jogador recreativo do Reino Unido.
Nesta mão, Hesp se envolveu contra o americano Scott Blumstein, na Mesa Final do “Main Event” da WSOP 2017.
A propósito, para quem não se lembra, Blumstein sagrou-se campeão do Main Event, faturando mais de 8 milhões de dólares!
Com certeza essa mão foi primordial para abrir os caminhos rumo ao titulo mundial.
A polêmica mão de John Hesp aconteceu enquanto ainda restavam 8 jogadores na “Final Table”.
Acompanhe como foi a mão (a partir do minuto 13:00):
YouTube – https://youtu.be/eLdlCgHsjwk
Wow!! Que Pot!!
Vou analisar a mão passo a passo, observando um ponto importante dentro da temática de valor e blefe, que é:
Identificar os ranges de Call, quando estamos jogando por Valor.
Buscar fazer a identificação criteriosa do range de Call nos ajuda a melhorar nossos Size Bets, para extrairmos o máximo de valor e também para não “overplayearmos” nossa mão, transformando nosso valor em blefe.
No E-book: Lógica do Poker: Decifrando “Valor e Blefe”, faço duas análises interessantes sobre Transformação de Valor em Blefe.
Vamos então à Ação!
A polêmica mão de John Hesp
Blinds 500.000 / 1.000.000 – Ante 150.000
Blumstein abre Raise para 2.300.000 no UTG, com AA.
Análise: Primeiramente, vamos definir um range para esse aumento do UTG.
Blumstein está abrindo Raise do início da mesa, tendo vários jogadores com stacks apertados entre 13 e 22 blinds, que vão jogar o range de valor deles com esses stacks, provavelmente de All-in.
Isso fecha um pouco o range de open raise, já que algumas mãos dentro deste range não querem pagar uma volta ou jogar fora de posição.
Essa é uma hipótese.
A outra, é justamente ao contrário, já que quase toda a mesa vai reagir apenas de All-in, dá para abrir bem o range para jogar de raise-fold.
Mas por toda a pressão envolvendo uma mesa final dessa magnitude, fico com a primeira opção.
Os pares baixos até o 5 são exemplo de mãos que não entrariam nesse range mais tight.
Definimos o Range de Blumstein em:
A ação girou em Fold até chegar ao Big Blind, John Hesp, um senhor de 64 anos, que joga poker recreativamente (torneios de 10 libras) na Inglaterra e que foi um grande personagem nessa WSOP, realizando o sonho de disputar o seu primeiro Main Event.
Ele tem AhTh e completa mais 1.3000.000
O FLOP: A75 rainbow
Ação: John Hesp dá check com Top Pair e passa a vez pro agressor da mão, Blumstein trincado no Ás, num bordo seco, com pouquíssimos draws.
Ok dar uma free card, também pede check.
Agora, com quais mãos o agressor não C-Beta nesse bordo?
Esse é um bordo muito bom para continuar apostando, principalmente quando “não se acerta”, mas quer continuar representando força para puxar o pot, já que muitas combinações com Ás estão no range de open raise.
Quando o agressor decide não apostar nesse bordo, ele provavelmente está em dois grupos de mãos:
- Uma mão de valor “médio”, que ele quer controlar o pot e evitar não “blefar a mão” já que nesse bordo sem draws contra um jogador recreativo na maioria das vezes tomará o Call apenas com mãos que estão lhe ganhando. (Um exemplo seria apostar com KK nesse flop, praticamente só iria tomar call do Ás, ou seja, perdendo, e fazer o adversário foldar o enorme range de mãos que está perdendo para o KK).
As mãos que considero desse grupo são: justamente os pares médios/altos e os Ases naipados baixos.
- Check por Trap (armadilha), com trincas, dois pares e “até” alguns ases do topo AK, AQ.
Praticamente todas as outras mãos do range pré-flop do Blumstein vão C-betar nesse Flop.
Podemos enxugar então o range do Blumstein em:
O TURN: A75 T rainbow
A confusão está armada, hein?
Você começa a enxergar o porquê da polêmica mão de John Hesp?
Ação: John Hesp dá check com os Dois maiores Pares.
Agora não tem mais motivos para Blumstein dar outra freecard.
O T (dez) é uma carta que já pode estar no range do Big Blind assim como ter aberto a possibilidade para várias combinações de mãos broadways agora possuírem Gut-Shot (broca pra sequencia) e até duas pontas com 89.
Blumstein aposta, por valor, 3 milhões, para tomar Call dessas mãos.
Vamos então raciocinar em cima do range do Blumstein, que chega nesse turn, como visto na imagem acima e identificar quais são as mãos de valor que ele tem e quais aguentam pagar um raise.
Quando se fala em Valor e Blefe, pouco se comenta que você aposta por valor quando identifica o range de Call do adversário e não somente pelo valor absoluto da sua mão, dois pares nesse caso.
Não vou entrar no mérito se a linha escolhida em dar Check-raise nesse turn foi boa ou não.
Nessa situação, ainda dá para identificar uma pequena parte do range do adversário que paga esse Check-raise estando atrás.
Então, até aqui, estamos jogando os dois pares por valor, para tomar call dos Ases fortes que deram “slow play”, o A5s, e quem sabe alguma broadway que tem Gut-Shot e vai jogar um grande pot em posição.
Foi a linha que o John Hesp usou, re-aumentou para 7 milhões total.
A ação voltou para Blumstein.
Check-raise
O Check-raise nesse Turn, com esse size e vindo de um jogador mais passivo, quase sempre representa Valor: top pair, dois pares, trincas ou em raras exceções alguns draws que conectaram com esse T.
Mãos como A9, A8, KT, QT… ele jogaria apenas de Call.
Observando isso, com o jogo entre os dois bem deepstack, é bem mais justo o Blumstein dar mais um aumento, buscando maximizar os ganhos contra o range forte do Check-raise de Hesp, do que dar apenas Call e ter a ação freada por um River que assuste o Hesp.
E foi isso que ele fez, 3-bet para 17 milhões.
A ação volta para o Hesp.
Aqui voltamos na importância daquele outro artigo que fiz: “Que toda ação insta deve ser evitada”.
O poker precisa ser raciocinado, e o raciocínio essa hora é sobre o range do adversário, para não cometermos erros. Faça perguntas..
Tem blefes? Quais? Blefes me pagam? Tem valor inferior ao meu que pagam mais uma aposta?
Se Hesp parasse um pouco mais para pensar, ele conseguiria enxergar as respostas para essas questões.
Ele notaria que todas as mãos piores que o AT não aguentariam pagar um All-in (nem mesmo o A7 e o A5), ainda mais desse tamanho, + de 60 blinds efetivos.
Ele errou nessa jogada. Esta foi a polêmica mão de John Hesp.
De toda forma, ele construiu uma história fantástica e merece todo o respeito e prestigio pela excelente 4ª colocação no Mundial.
A reflexão do artigo é sobre a identificação do range oposto. Quais mãos me pagam? Estarei mais vezes na frente ou atrás? Noção de Valor e Blefe na essência.
Se você concorda ou discorda, deixa um comentário logo abaixo com a sua opinião!
O que você achou da polêmica mão de John Hesp?
Abraços,
“Nós nunca ganharemos mais dinheiro do que conhecimento. Invista nele. Estude bastante!”
João Duque, 31 anos, Empreendedor, Brasiliense. Dedica parte do seu tempo ao grind e estudo dos “Torneios Turbos”, é Sócio-Diretor do Brasil Poker.
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